Domingos Montagner e o descaso de ambos os lados

"A culpa é dos dois lados!"

A morte do artista Domingos Montagner "parou" o país. Não por menos, pois se tratava de uma pessoa extremamente querida e que despertava simpatias até mesmo em gente que apenas o visse. Um exemplo!
Montagner foi levado pelas águas do São Francisco perto da usina de Xingó, em um local que eu classificaria como ponto de suicídio: grandes profundidades, pedras e muita, mas muita correnteza. O pior de tudo: não havia sequer bóias de sinalização, muito menos uma simples placa alertando para os perigos do local.
O Rio São Francisco, naquela região, corre encravado em um cânion, local perfeito para a construção da usina de Xingó. Barragem acima, as profundidades passam tranquilamente dos 170 metros, há quem diga que em pontos localizados, supere os 200 metros, o que não é algo realmente duvidoso. 
Pessoas não se preocupam normalmente com números porque 170 metros não são grande coisa se não aplicarmos uma análise perspectiva disso:

1- A chaminé do gasômetro, em Porto Alegre, possui 117 metros de altura, portanto, caberia com folga no cânion do são Francisco.

2- O edifício Altino Arantes, em São Paulo, possui 161m de altura, e ainda assim, sobrariam 9 metros de profundidade até alcançar o topo.

No caso infeliz de Montagner, as profundidades locais são mais 'amigáveis', mas ainda assim, surpreendentes: entre 30 e 60 metros, senão muito mais.
Eu decidi fazer um gráfico comparativo em escala usando como referência o número de pixels e aplicando a regra de três:

 Diante de tudo isso, ainda restam as evidências visuais nas quais Montagner foi imprudente:
1- A correnteza no local se faz clara e evidente mesmo à distância. A força das águas impressiona:



2- A água é tão limpa que deixa transparecer vários perigos, como esse flagrado acidentalmente numa matéria da globo:
Reparem no "drop off" que há ali. Trata-se de uma parede que pode descer mais de 30 metros em um passo apenas.
Agora, uma foto da prainha do canindé, sinalizada:
A distância de segurança é ridícula, trata-se de uma "praia de tombo" das mais perigosas. São pouquíssimos metros de área segura para banho. Lembra muito a prainha da cidade de Itá/SC, onde, em menos de 60 metros adentro do profundo reservatório da UHE Itá (138 metros), as profundidades já atingem 70 metros:

 

A prainha de canindé foi uma obra do governo do Estado do Sergipe. Foram gastos quase 7 milhões em infraestrutura, e nem um real em sinalização. O local deveria ser pesadamente sinalizado com bóias e, principalmente, placas informando os turistas dos riscos, incluindo a profundidade. Aliás, deve ser realizado um levantamento batimétrico completo da área e disponibilizá-lo para conferência do público.
 A imprudência de ambos os lados resultou em tragédia. Sabemos que mais delas ocorrerão país afora, mas é papel de todos incentivar a cultura do cuidado.

 

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